Review

Assetto Corsa: Vale a Pena?

por Hugo Bastos
Assetto Corsa: Vale a Pena?

O maior aliado, ou pior inimigo, de alguém ou algo, é ele mesmo. Assetto Corsa prova que este postulado é mais que verdadeiro.

Trata-se de um simulador de corridas, lançado em 2014 para PCs, e recentemente, para consoles. Um dos pontos altos do jogo é a ênfase na experiência de corridas realista, e vasto suporte a personalização e “moddalismo” (desenvolvimento de mods por fãs). E não se engane. Assetto Corsa é tido como um dos mais realistas no que toca a jogos de simulação.

Não para menos. O jogo foi desenvolvido pela Kunos Simulazioni, uma empresa italiana especializada em criar simuladores de corrida. E tal paixão traduziu-se em um jogo aclamado pela crítica em seu lançamento inicial. Não apenas isso: a integração de conteúdo criado pela comunidade de jogadores, desde o início, sempre foi incentivada pela empresa.

Dessa forma, seu lançamento para consoles era apenas uma questão de tempo. E, após promessas de um game completo, com uma física próxima a realidade e carros de grandes marcas (além de dois adiamentos), finalmente o game foi lançado no fim de agosto para os consoles. E então, percebe-se que, de fato, seu maior inimigo é você mesmo.

Aviso: Todos os vídeos da análise, exceto o vídeo de apresentação do jogo, foram feitos utilizando o jogo final, na sua versão mais atual, pelo reviewer do jogo, e com a ferramenta de edição ShareFactory, própria do PS4.

SOBRE A JOGABILIDADE…

O jogo é, de fato, um simulador que tenta, ao máximo, trazer a realidade das pistas aos consoles. Inicialmente, o jogador pode escolher entre três opções de jogo:

  • Eventos Especiais (se trata de testes específicos com carros e pista pré-determinados);
  • Pilotar (permite escolher o tipo de evento, condições da corrida, entre outras, bem como jogar online);
  • Carreira (é o “modo história” do jogo, onde as habilidades do jogador como motorista serão aprimoradas a medida que ele avança desde o mais básico até desafios extremos).
Três são os modos de jogo, e mais opções estão "embaixo do capô"...
Três são os modos de jogo, e mais opções estão “embaixo do capô”…

Os modos de jogo estão disponíveis já ao inicia-lo, mas no modo Carreira, novas séries apenas ficam disponíveis após o término de séries anteriores. Uma adição interessante, e que não se vê muito nos jogos desse estilo, é o modo “Drift”, onde o jogador consegue pontos ao passar pelas curvas tangenciando-as.

E para o desempenho máximo, é necessário saber ajustar as configurações do carro. E é aí que o jogo começa a se destacar.

Cada carro pode ser configurado de forma diferente, para cada pista diferente
Cada carro pode ser configurado de forma diferente, para cada pista diferente

Como a imagem mostra, os carros podem ser configurados de forma independente. E cada configuração pode ser salva para uma pista específica. Assim, o jogador evita ter que refazer a configuração quando necessário. Importa ressaltar que nem todas as configurações estão abertas a todos os carros. Como no exemplo acima, algumas não poderão ser feitas.

Assetto Corsa realmente leva a sério a alcunha de “simulador de corrida”. Cada configuração tem um efeito específico sobre o carro. E tais efeitos são a chave entre a vitória e a derrota. Até mesmo a temperatura dos pneus influencia no desempenho do veículo dentro das pistas.

Diversas opções podem ser modificadas antes da corrida, para servir aos diferentes tipos de jogadores
Diversas opções podem ser modificadas antes da corrida, para servir aos diferentes tipos de jogadores

Um ponto negativo nesse quesito é a falta de uma opção para comprar peças e melhorar os veículos. Não chega a ser um problema de gameplay, mas aqueles acostumados a Gran Turismo certamente sentirão falta. Ou seja: você pode aumentar o desempenho do carro com diferentes configurações, mas não pode melhorá-lo com peças. Também não pode modificar sua lataria, e as opções de pintura são limitadas.

Os controles são precisos e configuráveis. Para um jogo de corrida, isso é essencial. Os carros reagem ao traçado, e se comportam de forma realista em diferentes terrenos (como quando este sai da pista, por exemplo).

A inteligência artificial também é um ponto a se comentar. Apesar de desbalanceada (como se analisará abaixo), ela age como um piloto de verdade. Comete erros e falhas. Mas também toma decisões coerentes, como defender sua posição nas curvas.

Apesar de alguns revezes encontrados, o jogo poderia ser considerado perfeito. Infelizmente, não é o caso.

…E OS PROBLEMAS ASSOCIADOS A ELA

Apesar de sólida, a jogabilidade apresenta problemas bastante comprometedores. O primeiro deles é sentido logo na primeira corrida, na primeira curva. O carro não possui a dirigibilidade que deveria. Falta aderência entre o carro e a pista, e isso compromete por demais a experiência, visto que o jogo é um “simulador de corridas”. E não vemos os carros deslizando no asfalto, em uma corrida real, sem motivo aparente.

Este vídeo exemplifica exatamente o que queremos dizer.

A opção de “Linha de corrida ideal” não funciona como deveria, o que frustra aqueles que são iniciantes. Para os leigos, a linha de corrida ideal marca na pista qual o melhor traçado. Indica também o melhor momento para aceleração, desaceleração e frenagem. Dessa forma, serve de ajuda para aqueles não familiarizados com as particularidades de um jogo de corrida.

Em jogos de simulação, é normal que ela seja dinâmica. Ou seja: muda de cor conforme a velocidade do carro e seu posicionamento na pista (se em retas ou curvas, por exemplo), visando informar a melhor estratégia a se adotar naquele momento, em termos de controle de velocidade. Não em Assetto Corsa.

Aqui, elas são estáticas. E não apenas isso: também não oferecem informações confiáveis. O que significa que, em algum momento, ela indica para desacelerar quando claramente é necessário acelerar para manter um bom ritmo de corrida. Ou mesmo indica aceleração em um momento de frear. O vídeo abaixo, gravado por este revisor para este artigo, exemplifica bem a situação.

As alterações no veículo podem ser feitas no pitstop, ou antes de iniciar a prova. Dessa forma, ou o piloto realiza uma parada, sendo transportado direto à garagem da equipe, ou reinicia a corrida.

Em pistas de testes, ou provas simples, isso não seria problema. No entanto, em provas da carreira, isso pode custar segundos e posições preciosas. E, ao reiniciar a corrida, o jogador precisa enfrentar tempos de loading que, por vezes, demoram mais que deveriam. Isso inviabiliza a estratégia da “tentativa-e-erro”, e pode frustrar muitos jogadores.

E, para completar, o jogo possui um erro, que não mostra estatísticas de alguns dos veículos, fazendo com que sua escolha dependa totalmente da sorte, ou de tentativas anteriores.

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Certos veículos não possuem certas estatísticas.

Como não há variação dinâmica de clima, não há mudanças que causem impacto durante a corrida. Exceto pela temperatura da pista, nenhuma outra variável modifica o curso de qualquer prova. Isso já é implementado a tempos por outros jogos de simulação. E sua contraparte do PC também já tem essa opção, criada por fãs, por meio de mods (estes já tornados oficiais pela desenvolvedora).

Cumpre ressaltar que uma opção bastante necessária a iniciantes, a troca de marchas automática, também não se comporta como deveria, especialmente nas curvas, onde o game teima em engatar a marcha errada para a situação.

E, por último, a inteligência artificial do jogo está demasiadamente difícil. Algumas comunidades de jogadores na internet já verificaram que, independente do quão bom seja o jogador, em determinados momentos, parece que o jogo literalmente quer que você perca.

Tal situação desbalanceia completamente o jogo. Enquanto as provas de Tomada de Tempo são relativamente fáceis, as provas de corrida se tornam um martírio.

VAMOS FALAR DE GRÁFICOS

Graficamente falando, não é inteligente compara-lo a sua versão do PC, visto que este possui poder de processamento gráfico sempre crescente, com o qual os consoles dificilmente conseguem competir. Sendo assim, será feito um paralelo entre os jogos similares existentes para PS4.

Os carros são muito bem modelados. Os efeitos de luz, reflexo e sombras agem como se fossem verdadeiros, e a sensação de velocidade é fantástica.

Apesar disso, os gráficos em geral não impressionam. Apesar de todos os elogios recebidos na versão para PC, esta não está a altura dos jogos de simulação atuais. E isso é visível já no trailer de abertura do jogo. Imagens granuladas, texturas que se desfazem aos olhos… E isso não é admissível a um jogo que foi, inclusive, adiado duas vezes.

As pistas também não aparentam o realismo alardeado durante sua fase de produção. Muito foi dito da renderização destas, feita inclusive com escaneamento a laser, buscando dar mais realismo e fidelidade ao traçado. Para exemplificar melhor, compare as duas imagens abaixo:

Esta imagem é do trecho da pista de Monza, do jogo Assetto Corsa...
Esta imagem é do trecho da pista de Monza, do jogo Assetto Corsa…
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…Enquanto esta outra representa o mesmo trecho, em um jogo diferente. Reparem as diferenças gráficas…

A versão dos consoles, também, não conta com a mudança de clima dinâmico. Dessa forma, até que uma futura atualização seja disponibilizada, não será possível correr em outro horário que não durante o dia, ou mesmo sob a chuva forte. O máximo que pode ser alterado é a neblina e as nuvens no céu.

Você não verá nada de diferente no jogo além disso aqui...
Você não verá nada de diferente no jogo além disso aqui…

Falta realismo em outros aspectos do jogo. A torcida é um deles. Em jogos de esporte, como o futebol, é interessante ver como a torcida reage ao seu desempenho. Em Assetto Corsa, ela se parece com bonecos de papel grudados nos bancos. Essa diferença é vista melhor se compararmos este jogo com outro simulador de corridas para PS4.

A torcida de Assetto Corsa não parece viva...
A torcida de Assetto Corsa não parece viva…
... Ao passo que, em outro jogo, ela parece.
… Ao passo que, em outro jogo, ela parece.

E tal situação é ainda mais difícil de aceitar quando se leva em consideração que Wipeout 2048, jogo de corrida futurista lançado ainda em 2012 para o Playstation Vita, possui uma torcida que reage mais que a deste game.

O HUD (as informações na tela) do jogo também apresenta falhas. Ele não é diferente dependendo do carro escolhido. Para aqueles que não gostam de jogar na visão do cockpit, acaba dando um ar de “mesmice” ao jogo. Mas, no tocante à visão interna, esta merece comentários.

Os carros, vistos do interior, estão muito bem trabalhados. O nível de realismo é alto, e a atenção aos detalhes é perceptível em cada botão do painel. As texturas do que pode ser observado mostram a dedicação da Kunos em entregar um produto fiel. Uma pena que não se possa admirar tudo dentro do veículo, visto que o campo de observação é pequeno.

Não obstante este fato, o piloto se comporta como um robô. Ao virar a “cabeça” para observar o interior do veículo, verifica-se que ele o faz de forma automática e nada orgânica. Durante a pilotagem, o movimento das mãos não condiz com a direção do carro, e é executado de forma rápida e mecânica.

ÁUDIO

O ponto mais forte do jogo. Os efeitos de áudio são impecáveis. Cada som, cada rugido do motor, cada derrapada. Até mesmo a diferença da pressão sonora entre o cockpit e o exterior pode ser percebida.

Durante as provas não há trilha sonora, apenas o som cru dos motores. Isso tem se tornado uma tendência em jogos desse tipo. É importante frisar: não se trata de um ponto positivo ou negativo. Apesar disso, é possível ouvir músicas por aplicativos de música ou por meio de dispositivo externo (sugestão deste reviewer: faça uma playlist com músicas da banda Sabaton)

Um ponto que certamente fará falta são as conversas da equipe no pits. Muito embora não seja padrão, jogos assim já estão apresentando esta opção. Alguns, como a série F1, da Codemasters, permitem até mesmo comunicação entre o jogador e a equipe nos boxes. Nada que diminua o brilhantismo desta parte do jogo.

OUTRAS CONSIDERAÇÕES

O jogo oferece não muito, mas o suficiente. Uma quantidade de carros razoável e pistas variadas. 12 localidades e 29 variações de pista. A quantidade de carros, contudo, não impressiona, mas agrada, de certa forma. Algumas montadoras, como a BMW, possuem muitas opções. Outras, como a Shelby, apenas uma.

Mas o interessante não é isso: apesar de ter sido disponibilizado com mais de 80 carros, como já foi dito, alguns deles não estão disponíveis no momento, e o jogador sequer consegue encontra-los na PSN para aquisição.

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Carros com esse símbolo estão no menu, mas o jogador não terá acesso até que um futuro DLC seja lançado.

Ou seja: não chega aos pés de Gran Turismo e suas centenas de carros e dezenas mais de pista. E neste caso, o jogo merece um paralelo com sua cópia mais velha. Muitas outras pistas e carros foram trazidas ao jogo por meio de mods dos jogadores, que se tornaram oficiais.

Ademais, foi disponibilizado, por meio de DLCs, pagas ou não, um vasto conteúdo ao jogo no PC. Dessa forma, tem-se a sensação de que Assetto Corsa foi, propositalmente, “aleijado” para seu lançamento, com o intuito de liberar mais conteúdo posteriormente, de forma paga, como a já anunciada parceria com a Porsche, cuja notícia pode ser conferida no link abaixo.

Para os caçadores de troféus e platinadores de plantão, uma notícia não muito boa: já se verificou, em muitas situações, que os troféus não estão sendo desbloqueados, muito embora os requisitos estejam sendo cumpridos. Isso pode frustrar muitos que desejam obter o máximo desse jogo.

CONCLUINDO…

Assetto Corsa é um jogo que, por muito tempo, foi bastante esperado por fãs de games de simulação. Há uma carência desse tipo de jogo, e seu nicho é específico e fiel. E verdade seja dita: a sua versão para PC, de fato, merece todos os elogios.

Mas falta muita coisa na versão para PS4. Muitos erros precisam ser corrigidos. Muitos parâmetros modificados. E o fato da não inclusão de conteúdos já disponíveis gera sentimento de dúvida e certa revolta.

Não se engane: é um jogo cheio de potencial. E que, talvez, em um futuro próximo, assim como Driveclub, venha a se tornar referência nesse tipo de jogo, e então valerá a atenção do jogador. Mas no estado atual, com o preço cobrado, e tendo em vista o valor do Passe de Temporada, alto demais para um jogo com pouco a oferecer, não vale.

4 - Selo de Bronze

*O jogo foi cedido pela 505 Games para avaliação

Hugo Bastos
Hugo Bastos
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Jogando agora: Nada no momento.
Hugo Bastos e revisor do Meu PS4, apreciador de uma boa comida, e de platinas difíceis. E viciado em Rogue Legacy, OlliOlli2, Dead Cells, e não dispensa uma boa noite de jogatina.